8 dicas para quem quer escrever melhor de Fábio Yabu
O autor Fábio Yabu foi membro do júri do prémio Bang! e partilha com os nossos leitores algumas dicas para quem quer escrever melhor.
Já imaginou, um médico que resolvesse não lavar as mãos antes de um procedimento cirúrgico, ou um advogado que resolvesse criar as próprias leis? Em relação às outras profissões, a escrita é um ofício com poucas regras e muita experimentação, onde nem sempre existe o certo e o errado. É claro que temos nossas convenções, como pontuação, ortografia e gramática, sem as quais cada um falaria um dialeto particular e a própria arte não existiria. Mas mesmo essas regras podem ser flexionadas ou quebradas de vez em quando. Afinal, quem teria coragem de questionar a escrita frenética de Saramago, sem pausas ou respiros em parágrafos que tomam páginas inteiras, ou os diálogos fundidos à narrativa sem pontuação de Cormac McCarthy? Muitos autores abominam adjetivos dizendo que eles empobrecem o texto, mas quem seria capaz de descrever vegetações luxuriosas e vapores miasmáticos como Lovecraft?
Há, portanto, como se aprender o caminho das pedras. Quando questionados ao longo dos anos, alguns dos grandes mestres da literatura deram seus conselhos para ajudar a iluminar o caminho de seus seguidores e aspirantes. Compilei aqui algumas das dicas que considero mais interessantes, sendo que algumas são divergentes ou até mesmo antagônicas, o que apenas enriquece a discussão. Já a sétima dica, é por minha conta. Espero que gostem! Boa leitura e… boa escrita!
- As três regras da escrita.
Para começar, já afirmo que é inútil procurar por regras ou listas do que fazer ou não. Na verdade, até existem três regras para escrever um romance, mas como disse W. Somerset Maugham, “ninguém sabe quais elas são”.
- Mostre, não diga.
Essa é a dica de ouro do cinema que é constantemente esquecida por autores estreantes, que por distração ou mesmo preguiça acabam trocando descrições e sensações por adjetivos. O melhor exemplo do “Mostre, não diga”, vem de Tchekov: “Não me diga que a lua está brilhando, mostre-me o reflexo da luz num pedaço de vidro quebrado”.
- Escute os outros. Mais ou menos.
Escutar a opinião alheia é sempre bom, mas com imparcialidade: “Quando as pessoas dizem que algo está errado ou não funciona para elas, elas estão quase sempre certas. Mas quando elas dizem o que está errado e como consertar, elas estão quase sempre erradas.” Neil Gaiman, infalível como sempre.
- Pare de procrastinar.
A procrastinação, muitas vezes disfarçada de “pesquisa de referências”, é o maior inimigo do escritor. Numa época em que estamos tão conectados, Zadie Smith recomenda que você desconecte seu computador da Internet. Essa opinião também é compartilhada por Stephen King, que recomenda que você feche a porta de seu escritório e só volte a abri-la depois que o texto estiver pronto.
- Encontre um lugar para escrever.
Pode parecer estranho, mas a imagem de que um escritor tem um “santuário” particular, onde recebe a inspiração divina em absoluto silêncio é, muitas vezes, irreal. Um certo agito ao redor pode ajudar muito na concentração. J.K. Rowling, por exemplo, escreveu boa parte de Harry Potter num café em Londres, o hoje famosíssimo Elephant House. Este vídeo mostra uma jovem e inexperiente J.K. afirmando seu contentamento com as 30 mil cópias de seu livro recém-lançado. Ah, se ela soubesse…
- Preocupe-se com a forma.
Se o conteúdo é o rei, a forma é a rainha. Stephen King, por exemplo, abomina advérbios: “A estrada para o inferno é pavimentada por advérbios”, afirmou ele em seu guia On Writing – A Memoir of the Craft. Acho que o mestre está absolutamente correto ao apontar a abundância de advérbios, especialmente na literatura inglesa, com algo a ser enfaticamente combatido. Adjetivos também são mal vistos por escritores por empobrecerem a prosa. A não ser, é claro, que você seja Lovecraft ou Shakespeare, que, quando não tinha um bom adjetivo à mão, inventava.
- Escreva como se estivesse com raiva.
Agora, minha dica pessoal: é provável que você já tenha escrito um e-mail para um amigo ou chefe, desabafando sobre uma situação em que passou, tentando elucidar de maneira mais clara possível o seu ponto de vista e, quando você se dá conta, o e-mail ficou gigante, riquíssimo em descrições, talvez até com uma frase de efeito para arrematar o final. Dê uma busca em seus e-mails antigos e veja como você foi profílico e (provavelmente) elaborou seus pensamentos de maneira ordenada e coerente. Aquele é o escritor que você pode se tornar. Agora, é só empregar essa energia na sua prosa! 😉
- Reescreva.
Para finalizar, ninguém poderia ir mais direto ao ponto do que Hemingway: “O primeiro rascunho de qualquer coisa é uma merda!”. Espero que esses conselhos tenham servido para te ajudar, mas lembre-se: “Não leve os conselhos sobre escrita de ninguém muito a sério.” (Lev Grossman).
Fábio Yabu nasceu em 1979, em Santos (SP). Suas histórias já fazem parte da vida de duas gerações. Aos 17 anos, criou uma das primeiras histórias em quadrinhos para a Internet no mundo: Combo Rangers. Em 2004, lançou Princesas do Mar, livro que ele mesmo transformou em desenho animado, hoje exibido em mais de 100 países. É também autor de outros livros infantis premiados, como Raimundo, Cidadão do Mundo e Apolinário, o Homem-Dicionário. Na literatura juvenil, publicou a graphic novel Independência ou Mortos e transformou a vida da Princesa Isabel num conto de fadas em A Última Princesa. Em 2013, reinventou os contos de fada clássicos em Branca dos mortos e os sete zumbis.