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Entrevista com Justin Cronin

Entrevista com Justin Cronin, publicada na revista Bang! 11

Por ocasião da publicação do livro mais recente de Justin Cronin, Os Doze, a sequela de A Passagem, ambos lançados pela Editorial Presença em Portugal e Editora Arqueiro no Brasil, aproveitamos para republicar a entrevista que o autor concedeu à revista Bang! 11 em 2011.

justin croninRevista Bang!: Foi considerado o evento literário do ano e os direitos de adaptação para filme foram vendidos ainda antes de o manuscrito estar terminado. O que cativou tanto os leitores na sua obra A Passagem?

Justin Cronin: Penso que tudo se reduz ao facto de os leitores gostarem de uma boa história – personagens pelas quais se interessam, um enredo que as faz continuar a virar páginas, uma escrita que torna as cenas vívidas. Mas também penso que o livro aborda certas ansiedades contemporâneas, de mudanças climáticas a terrorismo e ameaça de uma pandemia global. É um mundo assustador, e os leitores gostam de exorcizar os seus medos através da leitura.

RB: Quão difícil foi combinar o horror, a ficção científica, o terror apocalíptico e o thriller, reforçados por referências literárias importantes e mitos gregos e bíblicos? Foi algo que surgiu naturalmente ou foi difícil prestar uma homenagem a cada um destes géneros e combinar todas as suas influências literárias?

JC: E não esquecer as influências ocidentais! Posto dessa forma, parece que foi algo muito difícil mas na verdade a escrita decorreu de modo muito natural.

RB: Uma dos pontos fortes do romance é o modo como torna os virais cientificamente plausíveis. Como é que evoluiu o background científico do romance? Foi tão fácil de lidar quanto as questões filosóficas e literárias?

DozeJC: Uma das minhas intenções originais era a de recriar o mito do vampiro sem magia. Não sou particularmente fã de magia na ficção. Parece algo demasiado fácil. Se permitirmos a magia num texto, qualquer coisa pode acontecer, julgo eu, e penso que um bom romance é aquele que surge dentro de limites bem definidos. Também considero que a magia foi em larga medida ultrapassada pela ciência no nosso tempo. Qual é a diferença entre o meu iPhone e uma varinha mágica? Não muita.

RB: Um dos momentos mais comoventes da primeira parte de A Passagem é a relação afectuosa semelhante a pai e filha entre Amy e Wolgast, que ecoa temas como a perda, luto e amor entre pais e filhos presente na peça de Shakespeare, Rei Lear. Na essência, A Passagem é uma história sobre a humanidade e a fragilidade dos laços humanos?

JC: É sobre a sua fragilidade, mas também a sua força. Qualquer romance sobre o apocalipse deve também dar lugar ao que pode ser salvo, e ao que vale a pena ser salvo, da humanidade.

RB: O seu romance também reflecte nas temáticas da morte e imortalidade. A imortalidade dificilmente poderia ser considerada uma coisa boa num mundo em ruínas como descrito na sua obra. Pode haver finais felizes para imortais?

JC: Finais felizes humanos, não. Muita da riqueza e cor da vida vem do facto de ser finita, e nós sabemos isso. A morte faz com que as coisas tenham mais importância.

A PassagemRB: Os leitores já estão fartos de vampiros graças a séries como a da Stephanie Meyer e todas as obras derivativas que se seguiram ao sucesso dessa autora. No entanto, algumas obras maduras e muito interessantes surgiram em anos recentes, como Deixa-me Entrar de John Ajvide Lindqvist ou A Estirpe de Guillermo Del Toro e Chuck Hogan. E agora A Passagem. Estes livos descrevem vampiros muito mais assustadores e perturbantes. Quanto mais os receamos, mais sentimos fascínio por eles?

JC: Os livros da Meyer não me interessam porque não foram escritos para mim – foram escritos para jovens mulheres. O que é perfeitamente justo. Também tenho uma filha adolescente. Mas as histórias de vampiros nunca irão desaparecer. Cada geração tem as suas histórias de vampiros, e eu tenho as minhas. Mas também li muitos livros de ficção apocalíptica quando era criança. Nasci em 1962 pelo que cresci durante a Guerra Fria. Essa foi a grande influência na minha escrita. Simplesmente usei vampiros como um meio para atingir um fim.

RB: Os cientistas e militares são os responsáveis pelos eventos apocalípticos presentes em A Passagem. Ambos estão a tentar criar o súper-soldado, um conceito também presente em outros livros, filmes e séries televisivas. Tal reflecte uma preocupação pela nossa realidade? Estamos condenados a correr para salvar as nossas vidas, como as suas personagens, num mundo que controla cada vez mais os movimentos dos seus cidadãos?

JC: As coisas parecem estar a evoluir nesse sentido, embora eu acrescentasse que as forças que nos controlam, pelo menos no mundo desenvolvido, são bem mais subtis e complexas. Como sabe o Facebook que estou interessado num serviço ou produto em particular? Rendemo-nos todos os dias, cada vez mais, à gigante máquina de marketing da cultura de consumismo. Provoca-me arrepios.

DozeRB: Sendo editora de uma revista de literatura especulativa e trabalhando numa editora que publica esse tipo de literatura, tenho consciência da fricção entre o género especulativo e a a literatura considerada mainstream. Parece ainda haver bastante preconceito contra a ficção científica, o horror ou o a história alternativa. No entanto, A Passagem conseguiu a difícil proeza de combinar sucesso popular com uma boa história de horror e com vampiros. Lev Grossman também conheceu o sucesso com o seu romance The Magicians, fantasia à Bret Easton Ellis. Está consciente da fricção entre estes dois mundos literários?

JC: É difícil não nos apercebermos dessa fricção, e sim, tenho consciência dela. Mas não é uma discussão na qual goste de me envolver; parece-me um pouco disparatado. Há ficção que é escrita meramente para entretenimento, e ficção que é considerada arte, mas a maioria da ficção cai num meio-termo entre ambos. Eu gosto de uma obra bem escrita, mas também gosto de um bom enredo.

RB: Pode nomear escritores de ficção especulativa que tenham influenciado a sua obra A Passagem?

JC: O livro mais influente terá sido Earth Abides de George Stewart, publicado na década de 40. Quando era criança, era, sem dúvida, o meu livro favorito.

RB: O que podem os leitores esperar do que resta da vida de Amy nos volumes seguintes de A Passagem?

JC: A sua vida é longa. Muito mais está para vir.

RB: Podemos esperar uma visita sua a Portugal algum dia?

JC: Adoraria! Por favor, alguém me convide.

Obrigado pela entrevista que concedeu à revista BANG!

[author] [author_image timthumb=’on’]http://revistabang.com/files/2013/09/justin-cronin.jpg[/author_image] [author_info]Justin Cronin, nascido em Nova Inglaterra, nos Estados Unidos, concluiu a sua formação em Harvard e no Iowa’s Writer Workshop. Anteriormente escreveu “Mary and O’Neil”, que venceu o PEN/Hemingway Award e o Stephen Craine Prize, entre outros títulos. “A Passagem” é o primeiro livro de uma grandiosa trilogia que entrou directamente para os lugares cimeiros das tabelas de vendas do “New York Times” e foi considerado um dos dez melhores romances do ano da sua publicação (2010) pela revista “Time”. Recentemente publicou a sequela Os Doze”.[/author_info] [/author]      

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